·
Jesus e os ensinamentos dos Orixás contidos no
Evangelho
A umbanda
vivencia O Evangelho de Jesus em sua
essência através da manifestação do amor e da caridade prestada pela orientação
dos guias e protetores que recebem a irradiação dos orixás. Encontramos no
terreiro da verdadeira umbanda entidades que trabalham com humildade, de forma
serena, caritativa e gratuita; espíritos bondosos que não fazem distinção de
raça, cor ou religião, e acolhem todos que buscam amparo e auxílio espiritual,
conforto para dores, aflições e desequilíbrios das mais variadas ordens.
Quando Jesus se aproximou de João
Batista, que, com os joelhos encobertos pela água do Rio Jordão, mais uma vez
falava do Messias, ao olharem-se um ao outro, uma força poderosa instalou-se
sobre todos os circunstantes. Jesus então aproximou-Se de João Batista, e este
ajoelhou-se aos pés do cordeiro do Cristo. Mansamente Ele o levantou e
agachou-Se sinalizando para que João O
batizasse. Nesse instante único, vibraram intensamente sobre Jesus, no
centro do Seu chacra coronário, o Cristo Cósmico e todos os orixás. Foi preciso
que o Messias fosse "iniciado" por um mestre do amor na Terra, para
que se completasse Sua união com o Pai, e ambos fossem um. Esse é um dos
quadros históricos mais expressivos e simbólicos que avalizam os amacis na
umbanda. Aos que nos criticam,
recomendamos que observem melhor os ensinamentos de Jesus, desprovidos de
"igrejismo" e patrulhamentos evangélicos religiosos.
Em todas as passagens do Evangelho de
Jesus podemos identificar a vibração dos orixás, conforme descrevemos a seguir:
Oxalá é a fortaleza, a vibração
do Cristo Cósmico na Terra, a doação
do amor incondicional, fraterno e perene, o profundo conhecedor da alma humana,
o ser abençoado de luz que irradia o equilíbrio perfeito entre o princípio do
masculino e do feminino. Seu olhar sereno e profundo, irradiando amor e
compaixão, Lhe permite penetrar o íntimo de cada um e não julgar, apenas amar e
curar, não somente as enfermidades físicas, mas as da alma. Seus braços
permanecem abertos em nossa direção e Seu Evangelho nos ensina estas máximas:
·
"Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo", pois não podemos amar a Deus, sem antes nos amarmos
e, por conseguinte, amarmos nossos semelhantes. Se não existe amor dentro de
nós, se não aceitamos nossas virtudes e defeitos, não podemos amar nossos
semelhantes.
·
"Eu sou o caminho, a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai senão por
Mim". Jesus nos mostra o caminho
da simplicidade e do amor fraterno, do desapego e do perdão. A confiança na
Providência Divina nos ajuda a difundir o Evangelho - caminho que leva a Deus,
à verdade que liberta e que nos faz deixar de sofrer. Tudo o que pode deixar de
existir amanhã não é verdade para nós, pois o que continua com a vida são os
afetos, as alegrias, os sentimentos que carregamos em nosso interior. Devemos
valorizar a nossa vida, buscando a verdade interior, o caminho para a
felicidade.
· "A minha paz vos dou, mas não
como o mundo a dá". Todos
deixaremos o teatro da vida terrena para encontrar a paz verdadeira na vida
espiritual. A paz do mestre está nos valores morais, na conduta da vida em
harmonia com as leis de Deus, na paciência para com as nossas imperfeições -
pois temos de vencer a nós mesmos -, e no despertar da consciência na escalada
da evolução, que nunca cessa. Cada mudança interior para melhor reflete-se na
convivência com o próximo. Quem ama sempre vai estar acompanhado, porque o amor
encontra ressonância em outros corações. Amar é doar-se para a vida, em favor
do bem.
Xangô é a sabedoria, o amor e o respeito à vida, em obediência às leis de Deus; é o
entendimento do encadeamento de nossas ações e reações, que estabelecem uma
relação de causa e conseqüência, no sentido de ascensão espiritual; é o
equilíbrio cármico.
No Evangelho, encontramos as vibrações de Xangô nas seguintes máximas:
· "Não julgueis para não serdes
julgados".
· "Com a mesma medida que medirdes
será medido".
· "Atire a primeira pedra aquele
que estiver sem pecado".
· "Vá e não peques mais, para que
não te aconteça coisa pior".
· "A semeadura é livre, mas a
colheita é obrigatória".
· "Conhece a verdade e ela vos
libertará" (a compreensão das leis morais divinas liberta da roda do
carma, das reencarnações sucessivas).
· "Perdoai setenta vezes sete
vezes".
· "Ide reconciliar-vos com vosso
irmão antes de pordes a vossa oferenda no altar".
Não podemos exigir aquilo que o outro não tem para nos
oferecer, nem a capacidade para compreender.
Para cada ação, há uma reação, seja
positiva ou não. Por isso, é preciso ter flexibilidade diante da vida, ter
misericórdia para com a dor alheia, perdoar para se libertar, refletir sobre a
capacidade de mudar, perceber qual a facilidade de aprender com a vida, estar
em paz e equilíbrio com a Lei Divina para poder receber, por meio do
merecimento pelo esforço empreendido para melhorar, as bênçãos que deseja
alcançar. Fazer o bem e desejar o bem.
O perdão das ofensas liberta dos
aprisionamentos do passado, das mágoas e dos ressentimentos, é o bálsamo que
cura as feridas da alma. Jesus nos pediu que perdoássemos ilimitadamente, ou
seja, sempre. E Suas últimas palavras terrenas foram uma súplica a Deus pela
humanidade: "Pai, perdoai-vos porque eles não sabem o que fazem".
A felicidade terrena não é integral,
mas é possível porque vem de dentro, do coração amoroso que faz o bem e que
deseja ao outro o que quer para si próprio. Amar, perdoar e servir foi o
exemplo deixado por Jesus.
Oxossi é o aconselhamento; o poder da
palavra em ação, o caçador de almas, o amor pela natureza e pela Criação; a
necessidade de saúde espiritual e física; a renovação, a nutrição, a
prosperidade em todos os sentidos.
A manifestação dessas virtudes são
observadas nas seguintes colocações:
· "Bem-aventurados os aflitos, os
mansos, os que são misericordiosos, os que têm puro o coração...".
· "Esteja no mundo, mas não seja do
mundo", pois quando Jesus esteve no meio da dor, da miséria humana, do
desespero, do materialismo, da traição, da arrogância, não se deixou
contaminar.
· "A boca fala do que está cheio o
coração".
· "Onde está o vosso coração, aí
está o vosso tesouro".
· "Amai-vos e instruí-vos".
· "Não são os sãos que precisam de
médico".
A chave do conhecimento tem de virar
sabedoria. Pela boca entram os alimentos e saem as palavras que, quando
harmoniosas, nos trazem equilíbrio e, por conseguinte, saúde.
· "Não vos inquieteis pelo dia de
amanhã, porque o amanhã cuidará de si mesmo".
É necessário saber pedir, colocar a
intenção no que se quer e ter confiança em si mesmo, na própria capacidade de
realização. Assim sendo, as idéias surgem para a solução dos problemas.
Ogum é a vontade, os caminhos abertos, a energia propulsora da conquista, o
impulso da ação, da vontade, o poder da fé, a força inicial para que haja a
transformação. É o ponto de partida, aquele que está à frente. É a vida em sua
plenitude, a vitalidade ferrosa contida no sangue que corre nas veias, a
manutenção da vida, a generosidade e a docilidade, a franqueza, a elegância e a
liderança.
A energia oriunda da vibração de Ogum
pode ser percebida claramente nestas palavras de Jesus:
· "A tua fé te curou" (com a
imposição das mãos, Ele acionou o poder da vontade de mudar de atitudes e
pensamentos).
· "Pedi e recebereis! Buscai e
achareis! Porque todo aquele que pede, recebe", demonstrando que Deus nos
dotou de inteligência e capacidade para que superemos nossas dificuldades,
recomendando-nos o trabalho, a atividade e o esforço próprio.
Precisamos aprender a pedir, pois
costumamos exigir soluções rápidas e eficazes para problemas de ordem material.
Estamos sempre correndo contra o relógio e perdidos entre compromissos
assumidos, os quais muitas vezes extrapolam nossa capacidade de cumprir.
Esquecemos de cuidar de nossos sentimentos, de ir ao encontro do que nos
realiza e nos dá satisfação interior, das coisas simples da vida.
Se acreditamos em reencarnação, então
sabemos que tudo aqui é transitório, que estamos na Terra para evoluir em
espírito, para superar a nós mesmos. O "pedir", colocado aqui, é no
sentido de "receber" da Providência Divina o ânimo, a coragem, as
boas idéias, a fim de que possamos crescer e adquirir a paciência necessária
para lidar com as nossas imperfeições e com as dos outros.
· "Orai e vigiai", pois a oração é o alimento do espírito; ela abre as
portas para a compreensão, é um bálsamo no momento das dores. A oração abranda
nosso coração, nos protege e nos fortalece. A vigilância é a resposta que vem
para aquilo que pedimos em
oração. Ocorre que geralmente pedimos, e depois não prestamos
atenção na "resposta", porque somos imediatistas. Mas nem sempre a
resposta que desejamos ouvir é a que chega até nós, e sim a que necessitamos
naquele determinado momento.
Por outro lado, devemos observar que
tipo de pensamento estamos alimentando em nossa mente, e o que estamos
atraindo. Vigiar no sentido de prestar atenção a nós mesmos, pois buscamos
auxílio espiritual na casa de umbanda, mas o que fazemos com a orientação
recebida? Continuamos o tratamento até o final, com passes, banhos, água
fluidificada, leituras esclarecedoras? Estamos dispostos a mudar nossa conduta?
Fazemos uma análise e higienizamos nossos pensamentos e sentimentos? Estamos
dispostos a nos desapegar dos sentimentos de culpa, de nos colocarmos como
vítimas das circunstâncias, de não participarmos ativamente da nossa
"própria" vida?
Ninguém fará por nós o que nós mesmos
temos de fazer, assumindo as rédeas da situação e acionando o curador interno,
pois a felicidade é um estado de espírito.
· "A fé remove montanhas. Pois, em
verdade vos digo, se tivésseis a fé do tamanho de um grão de mostarda, diríeis
a esta montanha: Transporta-te daí para ali, e ela se transportaria, e nada vos
seria impossível."
Na realidade a fé é ativa; é inspiração
divina que nos auxilia a chegar ao fim desejado; é a confiança que fortifica e
a certeza de vencer os obstáculos. A fé se prega pelo exemplo e precisa ser
apoiada na razão, porque é preciso amar e crer sabendo porque se ama e porque
se crê. A fé caminha de mãos dadas com a esperança e com a caridade; está
intimamente ligada ao poder da vontade, à crença interior de vencer as
adversidades pela paciência que traz a compreensão dos fatos.
O Evangelho Segundo o Espiritismo
nos diz (capítulo 9) que o magnetismo é uma das maiores provas do poder da fé
posta em ação. É pela fé que Jesus curava e produzia aqueles fenômenos
singulares, qualificados outrora de milagres. É a vontade dirigida para o bem.
Tudo quanto a nossa mente poderosa
acreditar e pedir com intensidade se realizará, por isso Jesus disse:
"Tudo quanto pedirdes em oração, crede que recebereis".
Ogum representa, portanto, o caminho que
precisamos percorrer; aquele caminho solitário para vencer os dragões internos
que, na verdade, é o espírito em busca de si mesmo; percorrer o caminho de
volta à unicidade com o Pai.
Somente quando aprendermos a amar e
compreendermos em nosso espírito esse legado de amor, perdão, compaixão,
não-julgamento, gratidão pela vida, respeito por nós e pelo próximo, quando
usarmos o livre-arbítrio com responsabilidade, não viveremos mais presos ao
passado, nem tão pouco angustiados e ansiosos com o futuro, compreenderemos de
forma integral que o momento de servir é agora. Jesus participava, servia,
ouvia, compartilhava, instruía e amava a todos sem distinção.
Yemanjá é o respeito, o
amor, o despertar da Grande Mãe em cada um, a percepção de que somos co-criadores
com o Pai, podendo gerar a "vida". Jesus tinha o princípio do
masculino e do feminino (animus e anima) em Sua essência divina, em perfeito
equilíbrio interno. Hoje, temos uma visão totalmente distorcida e masculinizada
do princípio feminino. Deus na realidade é: Deus-Pai-Mãe-Espírito. Temos dificuldade de penetrar na essência do feminino,
que é a emoção, a doçura, a compaixão. É a energia que flui, a essência da
doação, da harmonia, da vida em perfeito equilíbrio com a natureza, que espera
com paciência, em seu próprio ritmo.
Na vibração do amor, tudo se harmoniza
e permite que vejamos e aceitemos as pessoas como elas realmente são. Amar é
abrir o coração sem reservas, desarmar-se, entregar-se e doar-se. As águas
representam as nossas emoções...
·
"Quem é minha mãe e quem são meus irmãos, senão aqueles que fazem a
vontade do Pai?", disse Jesus
demonstrando que Seu amor ampliava-se à toda a humanidade, para nos ensinar
que, rompendo com os grilhões do parentesco carnal, formamos uma única família
universal.
Yemanjá, em sua vibração divina, cria
os seus filhos para a vida, para que sejam cidadãos do mundo, respeitando a
individualidade de cada um. Mãe zelosa quer e visa unicamente ao bem de sua
coletividade. É considerada a Grande Mãe porque acolhe também os filhos
adotivos, de outras mães. Num terreiro de umbanda é a agregadora dos grupos, o
sentido de união, o humanitarismo, a procriação no sentido de progresso e
prosperidade.
Vovó Maria Conga nos esclarece: "O
amor compreendido e praticado é como um pintor que reproduz obras que favoreçam
a todos que são abrangidos pelo seu raio visual, provocando o desenvolvimento
de novos valores internos, modificando os quadros mais íntimos de cada um, com
as novas tintas e pincéis das conquistas realizadas em favor do outro".
Sendo assim, surge a caridade com si
mesmo, que restaura no indivíduo a sua dignidade psíquica, levando-o a superar
o momento de dificuldade na conquista do alimento, da manutenção do lar, da
educação e da saúde por meio do próprio esforço. É o "ensinar a
pescar" que propicia o alimento sempre.
O
mar é o nosso maior provedor de alimentos e de pulsação da vida - este é o
sentido de prosperidade. No seu movimento de fluxo e refluxo das marés, limpa,
energiza, leva o negativo e transforma-o em positivo, promovendo o equilíbrio.
Jesus reunia-Se com Seus discípulos nos
finais de tarde, às margens do mar de Genesaré, para ensinar-lhes sobre o
"reino dos céus", e transformá-los em pescadores das almas. Em Seu
diálogo com Maria de Magdala, no livro Boa Nova, psicografado por Chico Xavier,
ela diz: "Desgraçada de mim, Senhor, que não poderei ser mãe". Então,
atraindo-a brandamente para Si, o Mestre acrescentou: "E qual das mães será maior aos olhos de Deus: a que se devotou
somente aos filhos de sua carne, ou a que se consagrou, pelo espírito, aos
filhos das outras mães?".
A palavra de Jesus lhe honrava o
espírito, convidava-a a ser mãe de seus
irmãos em humanidade, aquinhoando-os com os bens supremos das mais elevadas
virtudes da vida.
"Vai,
Maria! Sacrifica-te e ama sempre! Longo é o caminho, difícil a jornada,
estreita a porta, mas a fé remove os obstáculos. Nada temas: é preciso crer
somente!".
E Maria de Magdala renunciou aos
prazeres transitórios da carne e dedicou-se integralmente a auxiliar os irmãos
em sofrimento, aliviando-lhes as feridas do coração, ficando até o fim de sua
vida terrena junto aos aleijados e leprosos.
Maria de Nazaré, mãe de Jesus, foi o
grande exemplo de fé e de entrega absoluta à vontade do Pai. Ela amou tanto o seu
filho único que jamais O impediu de cumprir Sua missão; pelo contrário, O guiou
com seu amor e sofreu com Ele o martírio infamante da cruz. Em retribuição a
esse amor, Jesus deixou a João, o Evangelista, Seu discípulo mais amoroso, a
incumbência de substituí-Lo nos cuidados com Maria.
Oxum é o amor-doação, o equilíbrio
emocional, a misericórdia e compaixão. Mãe das águas doces, Oxum possui uma
força de penetração fora do comum na natureza humana: é a psicóloga nata.
Corresponde à nossa necessidade de equilíbrio emocional, concórdia,
complacência e reprodução (não necessariamente reproduzir no sentido físico,
mas no emocional que liga a mãe ao rebento vindouro). É a mãe que cuida do feto
durante toda a gestação, e entrega-o a Iemanjá, na hora do nascimento, para
cumprir a sua missão na vida. O amor-doação de Oxum é aquele que faz a caridade
ao próximo, que agasalha, alimenta e reconforta.
Em O Evangelho Segundo o
Espiritismo (capítulo 6), Jesus, o psicólogo das almas, diz: "Vinde
a mim todos vós, que estais cansados e aflitos, e vos aliviarei, porque o meu
fardo é leve e o meu jugo suave".
Em Mateus: 25, volta a dizer: "Vinde, benditos de meu Pai, possuí o Reino que
vos está preparado desde o princípio, porque eu estava com fome, e me destes de
comer; estava com sede e me destes de beber; andava estranho e me acolhestes;
estava nu e me vestistes; estava doente, e me visitastes; estava preso e me
viestes ver". E ao ser abordado
pelos justos: "Quando foi, Senhor, que te vimos com fome, com
sede, estranho, nu, doente ou preso, e te acudimos?", Jesus respondeu:
"Em verdade vos digo, tudo o que fizestes ao menor de meus irmãos, a mim é
que o fizestes!".
Portanto, o Cristo interno não
despertará em nós, se não ajudarmos a despertar externamente o Cristo no próximo.
Essa é a grande Lei da Polaridade Cósmica. São Francisco, Gandhi, Chico Xavier,
e tantos outros, encontrando o Cristo nos outros, encontraram-no em si
próprios.
Esta é a máxima da caridade: auxiliar e
servir aos necessitados, porque só assim estaremos realizando a caridade em nós
mesmos. Conforme disse São Francisco de Assis: "É dando que se recebe, é
perdoando que se é perdoado".
Há mais felicidade em dar do que em receber. O beneficiado
recebe o bem que eu faço, mas o benfeitor se torna bom pelo bem que faz, e
antes de realizar qualquer bem no outro, ele o realiza em si mesmo. O amor se
manifesta por meio da caridade; sendo assim, o meu amor cresce com a minha
caridade.
São Francisco beijou as chagas fétidas
de um leproso, escolheu o sofrido e ínfimo irmão de Jesus e, nesse momento,
realizou em si o nascimento de Cristo, rompendo a rigidez que o separava de sua
verdadeira auto-realização. Ao romper com o ego humano, exultou o Eu Divino.
Iansã é o movimento, a necessidade de mudança, de deslocamento.
Representa a rapidez de raciocínio (o raio), a coragem, lealdade e franqueza.
Higieniza os pensamentos; atua nos campos santos, em auxílio aos desencarnados,
e no despertar da consciência. Está ligada à orientação e à educação.
Representa a luta contra as injustiças. Sua propensão é trazer equilíbrio às
ações humanas. Atua junto com Xangô na Justiça, na aplicação da Lei Cósmica.
Quando o Mestre Jesus referiu-Se aos
que estavam dispostos a apedrejar uma mulher adúltera em praça pública,
dizendo-lhes:
"Aquele que estiver sem pecado, que
atire a primeira pedra", todos
foram saindo em silêncio e O deixaram a sós com ela. Então, Ele a olhou bem no
fundo de seus olhos e lhe disse: "Vá e não peques mais, para que não te aconteça
coisa pior!". Nesse momento, o
Mestre manifestou novamente o "não julgar", a reflexão, a
oportunidade de recomeçar e a necessidade de mudar de atitudes, para poder
prosseguir na caminhada evolutiva.
Em outra passagem do Evangelho,
diz Jesus: "Não vim trazer a paz, mas a divisão. Vim para lançar fogo à
Terra; e o que é que desejo senão que ele se acenda?". Essa é uma atuação clássica da energia de Iansã,
simbolizada no raio, como força da natureza. A idéia nova de Jesus encontrou
resistência, incompreensão; trouxe à luz as verdades divinas sobre o reino dos
céus, e incomodou a crença materialista de Sua época, que submetia o povo à
violência e abusos das mais variadas ordens.
Quando "imolaram o homem" no
martírio da cruz, pensaram que haviam resolvido a questão, mas a idéia de Jesus
permanece até hoje, Seu chamado continua sendo A Boa Nova, a conquista do
espírito sobre a matéria, a liberdade de ser, e não a escravidão do ter, a
comunhão com o Criador, irradiando amor incondicional sobre todas as criaturas
e a natureza. Ela nos instrui sobre as dificuldades dentro da própria família,
as incompreensões por estarmos reunidos na carne, mas com etapas evolutivas
diferentes, não partilhando da mesma crença.
Iansã é o fogo, posto que a mediunidade
é um fogo sagrado, um dom que nos foi ofertado por Deus para corrigir nossas
imperfeições e nos ensinar a amar e a servir com humildade. É o fogo da
Criação, a capacidade de superar-se, porque as leis cósmicas não permitem
estagnação por muito tempo: exigem a nossa evolução, ou seja, o potencial divino
que habita cada ser necessita ser externado como chama viva, e não vibrar como
brasa que não é alimentada, ou fagulha que se apaga. Por isso, temos o
livre-arbítrio para escolher entre servir e amar, ou simplesmente ser uma
criatura acomodada e ociosa. A escolha é inteiramente nossa, e a
responsabilidade também. A pressa de que o fogo se acenda é para que haja a
transformação do homem, para que cessem as guerras e as divisões internas e
externas, visto que a paz nasce dentro do coração do ser.
E segue Jesus, no Sermão do Monte:
" Bem-aventurados os pobres e os aflitos...". "Bem-aventurados
os pacíficos e os simples de coração...". "Bem-aventurados os
sedentos de justiça e misericórdia...". É o despertar do homem de bem.
Omulu-Nanã Buruquê é a transformação, a necessidade de compreensão do
carma, da regeneração e evolução. Representa o desconhecido e a morte, a terra
para a qual voltam todos os corpos, a terra que não guarda apenas os
componentes da vida, mas também o segredo do ciclo da vida, a transmutação.
Omulu conhece a dor da transformação, o
desapego e a libertação do ego, para que haja compreensão do espírito imortal e
livre, porque o espírito sopra aonde quer. A morte, não só no aspecto físico,
mas a morte de crenças e valores arraigados que não servem mais e que acabam
por enrijecer e estagnar a caminhada por medo de mudar, de conhecer a si mesmo.
Nanã recolhe o espírito no momento do
desencarne, logo após o corte do cordão de prata feito por Omulu, e o encaminha
ao plano espiritual de forma amorosa e com a paciência de quem conhece as dores
da alma e o receio de encontrar a si mesmo, respeitando a individualidade e o
momento sagrado de cada um, no seu rito de passagem à outra dimensão.
Em O Evangelho Segundo o
Espiritismo (capítulo 4), Jesus disse a Nicodemus:
"Em verdade, em verdade, digo-te que
ninguém pode ver o reino de Deus se não nascer de novo". "O que é
nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é Espírito".
"Não te admires que eu tenha te dito que o espírito sopra aonde quer e
ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem ele, e nem para aonde vai: o mesmo
se dá com o homem que é nascido do Espírito". Nessa passagem, o Mestre nos esclarece que o homem é
co-criador com Deus, gera o corpo carnal que vai abrigar o espírito que é de
Deus, para que possa cumprir sua missão evolutiva na Terra. O corpo procede do
corpo e o espírito independe deste.
Já a "pluralidade das
existências" e a "reencarnação" estão subentendidas no trecho
"o espírito sopra aonde quer". A reencarnação é uma forma de
fortalecer os laços de família, em que muitas criaturas se reúnem pela afeição
e semelhança das inclinações, para trabalhar juntas pelo mútuo adiantamento.
Mas, na maioria das vezes, a parentela carnal necessita reajustar-se e voltar a
amar, pois este é um elo frágil como a matéria e com o passar do tempo se
extingue. Por isso, muitas pessoas se sentem estranhas no lar onde habitam,
pois ali estão para ajudar umas às outras até que esses laços se rompam de
forma natural. Isso ocorre porque contraíram débitos em outras existências, e
terão de pagar ceitil por ceitil, trabalhando a compreensão, o reajuste e a
aceitação das imperfeições próprias e alheias.
Conforme o grau evolutivo de cada
espírito, há um lugar para viver entre uma encarnação e outra. Quanto mais
evoluído o espírito, mais liberdade tem em estado de ventura e amor. Quanto
mais comprometido, mais reencarnações, mais necessidade tem de superar as suas
dificuldades e dores. Porém, Deus em Sua infinita bondade e amor, não abandona os
Seus filhos e enviou-nos Seu anjo de amor, para nos ensinar sobre o reino dos
céus, que não é deste mundo, e em Seu momento de maior dor rogou a Deus por
nós: "Pai, perdoai-vos porque eles não sabem o que fazem!".
A umbanda, em seu trabalho de amor e caridade, leva a palavra
de conforto e esclarecimento aos que sofrem, e se espelha nesta parábola de Jesus:
"E o semeador saiu a semear...", não importando se o terreno ainda é árido, se existem espinhos, se os
pássaros comem as sementes, pois pode ser que a semente caia em um solo fértil,
no terreno daqueles que sabem que precisam trabalhar dentro de si a compaixão,
a humildade e o amor pelo próximo. Os benfeitores espirituais vão estar sempre
a disseminar o Evangelho de Jesus e a nos assistir e orientar, incansavelmente,
em nossa jornada terrena.
Nossa profunda gratidão pela
oportunidade que nos é dada de despertar a consciência para o servir e o
aprendizado do amor, que ainda é pequeno em nós, porque para eles somos
crianças espirituais em aprendizado.
( Livro: Umbanda Pé no Chão,
capitulo 6, Norberto Peixoto, Ramatis)